Não quero mais sentir isso - uma armadilha
- Leo Rampasso

- 30 de nov. de 2024
- 6 min de leitura
Atualizado: 29 de jan.

Você já sentiu medo ou ficou preocupado com aquilo que podem estar pensando de você, com aquilo que podem falar sobre você pelas suas costas? Já teve raiva de alguém ou de você mesmo por não ter feito algo da forma que você gostaria, ou que você acredita que deveria ser feito? Se julgou por não alcançar aquilo que sem dúvidas nenhuma você deveria dar conta? A nossa cabeça às vezes é bem cruel com a gente mesmo e pode nos causar muita dor. Sentimentos e pensamentos podem ser bem difíceis de se lidar e por isso tentamos controlá-los, tentamos evitá-los. Você muito provavelmente já fez isso, e eu também. Eu também sou assim, também passo por essas dores. Tenho medo de ter conversas difíceis, penso às vezes que não sirvo para ser psicólogo, duvido que aqueles que me cercam me amem de verdade. Aquilo que está dentro de mim de vez em quando me causa muita dor e essa é uma dor bem difícil de se lidar.
Escrever esse texto, por exemplo, é algo que é difícil, pois enquanto eu tento escrever me vem um pensamento: “será que eu consigo escrever algo bom, que faça sentido para as outras pessoas, que elas gostem?” E desse primeiro pensamento vêm outros: “eu sou mesmo capaz de escrever esse texto?” “Outros psicólogos fariam isso muito melhor que eu.” “O que eu escrevo é pouco, pequeno, é ruim.” “Vão rir do meu texto com certeza”. “Vão rir de mim.” “Sou uma pessoa digna de riso, digna de pena.” “Sou uma pessoa pequena"...
Então o que eu faço? Eu fujo. Fujo desses medos, desses pensamentos. Foi o que eu fiz por um tempo, abalado e assustado demais para fazer qualquer outra coisa. Eu abro o celular e vou para o feed do Instagram, vou assistir uma série na Netflix… ou vou fazer coisas úteis, como lavar louça ou até mesmo trabalhar - poxa, ninguém negaria que são coisas importantes. Mas, todas elas são formas de eu fugir, de eu não ter que lidar com esses pensamentos, esses sentimentos.
E eu sei que não sou só eu que sou assim, pois o que eu mais escuto nas primeiras sessões de terapia é “eu queria não me sentir assim”, “queria poder não ter raiva”, “não ter medo”, “queria não pensar que sou um inútil”, “não pensar que sou uma mãe ruim”... O formato muda, mas a queixa é sempre a mesma: é sobre a dor que vem junto de um sentimento ruim, um pensamento difícil, algo que está acontecendo dentro de mim e eu queria que não estivesse aqui comigo, pois se não estivesse, eu não sofreria tanto, não do jeito que eu sofro. Essa é uma dor muito grande, muito difícil de se lidar e, infelizmente, muito comum.
E o que todos fazem sobre isso? Fogem. Todos fogem dessa dor, todos tentam controlá-la. De forma geral, conseguimos entender o mundo que nos cerca muito bem, sejam problemas do trabalho ou o passo a passo de fazer uma comida, controlamos e resolvemos esse mundo de tarefas. Mas quando olhamos para nosso mundo interno, nossos pensamentos, sentimentos e emoções, memórias, histórias e personalidade, qualidades e defeitos, a coisa muda: Para onde quer que eu vá, eu estou comigo, meus pensamentos estão comigo e eu não consigo fugir de mim mesmo. E parece que quanto mais eu tento resolver o que há de errado comigo e com meus sentimentos, mais eu me convenço que não há o que fazer. Isso pois o mundo que está sob nossa pele, na nossa cabeça, mente ou coração, não é um problema a ser controlado ou evitado. É parte de quem somos. Ainda que, muitas vezes, uma parte difícil de lidar, uma parte que nos cause muita dor.
Então, o que acontece quando fujo de um sentimento difícil? Quando tento controlar um pensamento espinhoso? Bom, é óbvio: fugimos dele. É o que aconteceu comigo ao deixar de escrever e ir fazer outra coisa, é o que acontece com a mãe que, ao duvidar de sua capacidade de cuidar de seu filho, vai lavar as roupas da criança. Quando fazemos isso, a dor, o sentimento ruim passa e ficamos aliviados, funciona. O que não é tão óbvio é que agir assim funciona só por um pouquinho de tempo. Ou, quando você deixa de ter aquela conversa difícil com seu namorado ou marido e vai fazer outra coisa, o medo de ter essa conversa não volta pouco tempo depois? Quanto a mim, no momento que meu celular vibrou com uma notificação de um cliente, isso me lembrou do meu trabalho como psicólogo e me lembrou desse texto que eu queria escrever, voltei a pensar nele imediatamente. Isso porque quando fugimos, a fuga nos protege só por um pequeno tempo, mas não funciona para sempre. Fujo e na hora é bom, mas não percebo do que eu abro mão ao fugir.

Quando fugimos de um pensamento ou sentimento difícil, ele volta. E volta mais forte, mais difícil, mais doloroso. Se, por exemplo, estou querendo fugir de ter uma conversa difícil sobre meu trabalho com meu chefe e eu fujo disso, eu aprendo que fugir é bom e me protege. Depois, passo a evitar aquela conversa difícil com meu namorado, pois se foi bom evitar com meu chefe, acho que será bom com meu namorado também. Depois não falo com meus pais sobre como nossa relação está e como gostaria que ela evoluísse… Quando vejo, todas as conversas difíceis estão sendo evitadas… Então as nem tão difíceis também, depois qualquer conversa, e assim o problema só aumenta, se torna uma padrão, um ciclo. Para evitar a ansiedade de agir e o medo do que poderia acontecer, eu abro mão de muitas coisas que me são muito importantes.
Ao fugir da ansiedade que essas conversas podem gerar, não resolvemos questões existentes em relações importantes para nós, nos distanciamos daqueles que amamos e abandonamos essas relações, pois só de pensar nelas, já é muito difícil, é muito sofrido. Se não nos afastamos fisicamente, nos distanciamos emocionalmente, gerando uma falta de conexão real, de uma conexão mais forte. Quando percebo, numa conversa com meu pai, eu me vejo mais ocupado pensando se eu sou um filho digno dele, fico junto desse pensamento que está tomando toda minha cabeça. Eu tento responder esse pensamento, argumentar com ele, ajo para provar para esse pensamento gigantesco que ele está errado e eu estou certo, faço tudo isso ao invés de realmente ouvir o que meu pai me diz e tentar me conectar com ele.
Fugindo, nos afastamos não só dos outros, mas também de nós mesmos. O medo me impede de sair de casa. A ansiedade me impede de ir para aquela entrevista de emprego. Os pensamentos de se eu sou capaz de escrever esse texto quase fizeram com que ele não saísse do papel. Assim, vamos perdendo contato com aquilo que é mais importante para nós, nos afastamos da vida que gostaríamos de viver e daqueles que mais amamos, tudo em nome de não sentirmos essa dor. Fugir pode ser bom logo no momento, mas o custo que é cobrado de nós depois é muito alto e não vale a pena - viver uma vida só fugindo de nós mesmos é uma vida que não vale a pena ser vivida, é uma vida vazia.
É muito difícil deixar esse padrão, esse ciclo. Estamos muito acostumados a agir assim, agimos assim a nossa vida inteira. Além disso, nossos pensamentos são sedutores. Quando estamos próximos deles, eles parecem ser tudo, ser nossa realidade e, se estamos muito próximos deles, vemos o mundo através deles sem nem nos darmos conta de que estamos fazendo isso. E assim paramos de viver no presente e passamos a viver no passado, remoendo erros e pensando em como poderia ter sido diferente, ou no futuro, com medo do que pode acontecer se… E provavelmente você completou essa frase com algum futuro terrível que você gostaria de evitar. Um problema gigantesco, mas que não aconteceu, não existe senão dentro de sua cabeça. Nossa cabeça facilmente começa a criar desculpas ou situações terríveis sobre seja lá qual é o problema que estamos vivendo, fazendo esse problema parecer gigantesco, e nisso nos afastamos de nós mesmos e daquilo que nos é importante.
E então, o que fazer? Se, ao ler tudo isso, você se percebe sofrendo por uma dor parecida com essa que eu descrevi, se você se vê lutando numa batalha interna que parece impossível de vencer, digo: que bom que você leu até aqui - isso mostra que você quer ajuda e fico feliz por você ter tomado o primeiro passo para sair dessa situação. Para continuar nessa caminhada, eu estou aqui por você, trabalhando a anos com dores como a sua e digo: eu posso te ajudar a lidar com essa dor de uma forma melhor, uma forma que você sinta que há espaço não só de passar pelos dias, mas para viver de fato. Vamos juntos começar essa jornada de mudança?
